A minha pior ressaca

A minha pior ressaca nem sequer é de bebida. Quando se sai, se tomam uns copos a mais na segurança das amigas que como nós nos vão apoiando, na alegre tagarelice de quem mete conversa com estranhos e no dia a seguir acorda com dor de cabeça. Com isso posso eu bem, comprimidos e mezinhas caseiras, descanso e o corpo é novo volta sempre ao sítio como uma pastilha elástica que ainda não andou tempo suficiente às voltas na boca: do meu corpo tomo eu conta, ele sofre mas é porque eu quero. 
Nada disso. Nem sequer estava a pensar em álcool servido em copos de vidro em chamas quando me lembrei de escrever sobre a minha pior ressaca. Não vou contar uma história de como acabei no hospital com um tubo de plástico na garganta, não vou falar de raspanetes dos meus pais. Não tenho assim tantas histórias interessantes de copos para contar  e mesmo que tivesse, aguento pouco e não sou de me gabar. 
A minha pior ressaca é a das coisas que já fiz e não vou poder voltar a ter, dos toques e da pele que julgava conhecer e que agora já não se aproxima mais, é uma ressaca de fazer doer o coração, ou qualquer coisa que ande lá perto. 
Se a bebida me toma conta do corpo, tudo o que penso sai directamente da cabeça para lá. Toda a minha emoção flui, pouco ou nada melodiosa, tem tão pouco de sinfonia, toma conta do meu corpo como uma corda que me aperta e me sufoca na garganta, toma conta dos meus dedos, das minhas articulações e dos punhos, cerrados: consigo sentir a bolha de ar a criar-se no meu peito à medida que respiro ou julgo respirar, se tivesse asma estas ressacas de pele que começo a sentir davam cabo da minha saúde, mais do que qualquer vodca, bagaço, whisky, não me lembro de mais. Não sou grande bebedora, mas sou uma grande sentimental.