em que o Verão lhe roubou tudo. Os sapatos, as moedas, os dedos. Mas afinal quem é que se importou, quem é que não preferia estar ali acima de todos os lugares? Com todas as flores, nuvens e homens que carregavam maçãs gigantes. Pelo menos Katie julgava ter visto um desses, uma dessas espécies raras de homens que carregam maçãs gigantes na cabeça e que só aparecem depois de se ter tomado uma dose considerável de comprimidos... E mesmo assim, não podia jurar tê-lo visto. Não lhe tirou uma fotografia, muito menos lhe pediu um autógrafo. Sentou-se num banco, com as mãos muito apertadas uma contra a outro no colo, e viu-o. Assim. Tão simplesmente como se piscasse os olhos, ali estava, o homem com a maçã gigante na cabeça, rodopiando pelo campo cheio de flores, como se nada mais importasse. Como se nem sequer as flores importassem, como se não merecessem tanto respeito como as pessoas. Ainda pensou em perguntar-lhe
- Whatta you gonna do with all that apple?
mas achou rídiculo, como se o homem a compreendesse. Estava na Irlanda, os homens que carregam maçãs não compreendem linguagem de raparigas drogadas aquela hora, como se ela própria compreendesse o turbilhão de palavras que lhe corriam pela mente, que lhe desciam pela língua carregadas de hormonas, vício, prazer, destruição.
Então chegou o dia em que o Verão lhe roubou tudo, sem prazo de lhe devolver fosse o que fosse. Gostava demasiado de moedas, de sapatos, de dedos estrangeiros. Tão carregados de sensações que desconhecia, de lugares onde ainda não tinha chegado. Como ao Polo Norte, onde Katie tinha estado em sonhos. Em expedição com os pinguins de fato e gravata; grandes, gordos e arrotantes de dinheiro e peixe morto. Por isso, o Verão não quis devolver coisa nenhuma que tivesse tocado em katie, nem mesmo um vestido de praia que apanhasse. Queria tudo, queria saber tudo e tocar, sentir, cheirar tudo, aproveitar-se da rapariga drogada cujo cheiro o drogava a ele, cheiro de vida. O Verão vive de pessoas, raparigas e hormonas. Então chegou o dia..
