A má-língua

Antes de mais, vamos meter tudo em pratos limpos; estaria a ser hipócrita se dissesse que não sou uma praticamente (quase) assídua desde desporto. Tanto sou uma praticante como sou uma ouvinte atenta e dedicada. A má-língua cumpre funções sociais importantes, tal como dar trabalho aos senhores da Caras, da Gente Nova, da Vip, da SuperPop, da Bravo, da revista do 24 horas e outra série de revistas pelas quais passamos os olhos e consideramos lidas ao fim de meia hora.
A má-língua confunde-se com a coscuvilhice, o boato e mesmo a difamação. É grave espalhar a notícia de que a Maria das Dores matou o marido. Mas é mais grave ainda se a Maria das Dores não tiver realmente morto o marido.
É verdade que a imprensa apadrinha a má-língua, porque vende revistas. Se as pessoas gostassem de ouvir que toda a gente é muito boazinha e muito pobrezinha como a Floribela, era isso mesmo que se escreveria e difamava por aí. Mas não. As pessoas querem sangue, querem enforcamentos em praça pública! É isso que enche de alegria um salão de cabeleireiro, é isso que enche os programas da Fátima Lopes e do Goucha. Tristezas. Fofocas. Desgraças. Lixo cultural. Acham sinceramente que estes senhores estão numa de Rock-in-Rio, por um mundo melhor? Qual quê. Por uma fofoca melhor.
Mas isto não passa só por gente rica e famosa, mas também pelos amigos, conhecidos, conhecidos dos conhecidos e primos dos conhecidos. Sobre o dono do café que vai às meninas. Sobre a tia Raquel que descobriu que tem dois úteros. Entre ditos, e "quem conta acrescenta um ponto", ouvimos infindáveis historietas sobre quem nos diz muito e quem não nos diz nada. Sem essa lingua afiada, como se alimentavam muitas conversas, muitas noitadas?
A crueldade das pessoas chega a inventar factos. Isto nunca me aconteceu, e digo de experiência própria, que só falo do que sei. Mas repito, sou uma ouvinte atenta e acho muita piada à quantidade de disparates que circulam por aí.
A má-língua, como tudo o que parece mal mas sabe bem, só precisa de uma teoriazinha qualquer que a legitime e que a torne mesmo obrigatória!